segunda-feira, 28 de junho de 2010

O Jornalismo do século XXI ainda é de papel?

Domingo, manhã de 27 de junho de 2010. Há exatos 30 minutos, antes de sentar à frente do computador para redigir este artigo, fazia a leitura de dois jornais impressos de circulação nacional. Antes, no sábado, fiquei quase a tarde toda ocupado em leituras de uma revista mensal e de dois livros que ganhei recentemente. Mas o que isso tem a ver com comunicação do século XXI? Tudo. Ao menos para mim.

A evolução dos veículos de comunicação, desde o seu surgimento, é marcada por especulações apocalípticas que, de tempos em tempos, voltam à tona. A mais recente diz respeito ao provável fim das mídias impressas – especialmente jornais e revistas – em virtude da proliferação e popularização da Internet. Nesta Copa do Mundo, então, fica cada vez mais claro este caminho sem volta. Tenho observado jornais impressos, emissoras de rádio e TV cada vez mais dependentes dos recursos e informações advindas da rede mundial de computadores. Até mesmo a disposição das informações – seja na diagramação nos impressos ou na disposição de áudio e vídeo nos outros meios – já segue um padrão inspirado na web. E o que tem de errado nisso? A meu ver, absolutamente nada.

A tão proclamada “convergência das mídias” mostra, neste momento, a que veio. É inegável a melhoria que a tecnologia traz para a vida de todos e o tanto que ela enriquece, se bem utilizada, as mídias tradicionais (impresso, rádio e TV). Mas ficar gritando aos quatro cantos que a Internet vai acabar com os demais veículos de comunicação chega a ser pensar pequeno demais. O importante para os gestores de comunicação é saber aperfeiçoar o recurso, usá-lo como soma, como aliado, não como inimigo. Um bom exemplo desta otimização vem sendo feito pela Folha de São Paulo. Com novo projeto gráfico e editorial, anunciado há cerca de dois meses, um dos maiores jornais do país soube aproveitar o que a Internet pode oferecer como conteúdo complementar às informações dispostas em seu meio tradicional e vem obtendo sucesso com isso. Está presente em uma página própria na rede (FolhaOnline) e também em várias das redes sociais virtuais mais aclamadas da atualidade, como o Twitter.

No entanto, acredito que a maior sacada da Folha não foi o de aproveitar da diversidade da Internet, até porque isso ela já fazia muito bem. Foi, sim, entender qual o real papel que o jornal impresso tem hoje e investir nisso. Alguém, em sã consciência, vai buscar nos jornais impressos alguma informação absolutamente nova a respeito de um fato? Provavelmente não, mesmo porque com muita possibilidade esta notícia já vai ter sido dada por alguma emissora de rádio, TV ou mesmo por algum site ou rede social na Internet. Isso porque o jornal impresso sempre vai ser feito e fechado para a impressão no dia anterior em que circula. E como a tecnologia ainda não nos mostrou como viajar no tempo, sempre o jornal de um determinado dia vai repercutir as notícias do dia anterior – que já foram dadas por estes outros meios.

Então, o que deve ser entendido é que o jornal impresso é ainda muito útil na disseminação de informações – principalmente no aprofundamento delas, visto que rádio e TV continuam limitados por questões de tempo. Tentar “competir” em rapidez com as outras mídias não é o certo, pois é uma questão física que impede este sucesso. A real função do jornal impresso hoje é fornecer interpretações acerca de um fato para o seu leitor, não tentar “furar” a concorrência das outras mídias. E é nisso que a Folha tem apostado: em aumentar e ter o melhor time de articulistas e comentaristas do Brasil para oferecer a seu leitor diversos caminhos para interpretar as notícias do dia-a-dia.

Ao usar como mote da campanha publicitária o lema “Jornal do Futuro” e anunciar mais de 100 articulistas, a Folha de São Paulo reforça a sua real vocação e utilidade: ser um meio de comunicação que vai oferecer aos leitores mais dados, comentários e análises para que ele, de posse de tais conteúdos, possa chegar às conclusões que quiser a respeito de qualquer notícia. É mais ou menos o que as revistas semanais já fazem há algum tempo: não se centram apenas no fato, mas buscam contextualizações para que o leitor possa, além de se informar minimamente, tentar entender as causas e conseqüências que geraram o mesmo fato e o que ele pode causar.

E é isso que os jornais impressos deveriam fazer: apostar cada vez mais em reportagens, em interpretações e opiniões embasadas para que os leitores continuem a ter a segurança de buscar nas páginas o que há de melhor no jornalismo e tirar suas próprias conclusões. Ressalto, no entanto, que as interpretações e opiniões devem ser claras, que os repórteres e articulistas se posicionem, para que não haja também confusão do leitor com uma eventual falta de imparcialidade. Mas isso é papo para outra hora.

Voltando ao início, fiz questão de relatar um pouco da minha manhã de domingo para mostrar que, por mais que o fim dos impressos já tenha sido anunciado diversas vezes, pelo menos um leitor (eu) continuará ávido pela informação no papel. E sei que, assim como eu, diversas pessoas também não abrem mão do prazer de ler notícias em um jornal impresso ou revista. Motivos não faltam: o gosto pela leitura, a profundidade das informações, as palavras bem escritas por jornalistas e articulistas experientes, a beleza do texto frente às imagens, até mesmo a textura do papel. Não que eu não admire e não goste das outras mídias – pelo contrário, sou também ouvinte, telespectador e internauta assíduo. Mas que o bom jornalismo do século XXI ainda tem seu lugar bem guardado nas páginas de jornais e revistas, ah, isso tem.

* Ricardo Nogueira
Jornalista, Mestre em Educação, Cultura e Organizações Sociais.
Professor nos cursos de Jornalismo e Publicidade e Propaganda.
Faculdade Pitágoras/Divinópolis

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