terça-feira, 14 de agosto de 2012

Toda unanimidade é burra?


Ricardo Nogueira
 
Jornalista, Especialista em Docência do Ensino Superior, MBA em Gestão da Comunicação Integrada, Mestre em Educação, Cultura e Organizações Sociais, Mestrando em Educação Tecnológica. Professor da Faculdade Pitágoras nos cursos de Jornalismo, Publicidade e Propaganda e Gestão Comercial.




O grande dramaturgo e jornalista Nelson Rodrigues foi extremamente feliz quando disse que “toda unanimidade é burra”. Tido como gênio e revolucionário por uns, e como louco e tarado por outros, o escritor sentenciou, como poucos, a importância de haver a contraprova, o questionamento, a dúvida. Para a imprensa, então, a frase deveria figurar numa lista de 10 mandamentos sagrados, no sentido de intocável mesmo. No entanto, infelizmente o que vemos na prática é que o benefício do contraditório passa longe das redações, na maioria dos casos.

Se vivemos em uma democracia em que o cidadão elege seus representantes por meio do voto direto, é de se esperar que estas pessoas representem, de fato, os anseios, vontades e necessidades da população. Porém, não é novidade para ninguém que este papel está longe de ser assumido por quem ganha para isso. Resta então a esperança no poder Judiciário. Este, por sua vez, padece da “burrocracia”, da lentidão e de seu linguajar técnico que o afasta das pessoas mais simples e, por consequência (ou por propósito), mantém-se quase sempre inacessível ou intocável.

Com as instâncias públicas “comprometidas”, coube à imprensa o dever e o papel de denunciar, investigar e, em certos casos, até mesmo punir as pessoas que agem contra os princípios da legalidade, moralidade e zelo com a coisa pública. Ao fazer uma análise do cenário político atual, percebe-se facilmente que nunca a imprensa teve a oportunidade de ser tão eficiente neste propósito, uma vez que não vivemos mais sob Censura (pelo menos legalmente) e, em tese, todos os órgãos de comunicação são livres para investigarem e publicarem o que bem entender.

Mas infelizmente não é isso o que vem acontecendo. Pelo contrário, é fácil perceber uma mordaça cada vez mais forte que cala a imprensa. A tática é que agora é outra: ao invés da Censura existir via Ato Institucional, ela ocorre pela questão financeira. É sabido por todos (ou ao menos deveria ser) que a imprensa, como toda e qualquer outra organização privada em um mercado capitalista, é movida por interesses mercantis. E, historicamente, há duas formas de se obter sucesso financeiro neste mercado de notícias: a primeira, publicando reportagens de interesse público, gerando, consequentemente, credibilidade e aumento nas vendas em bancas e assinaturas; e a segunda, dependendo financeiramente de anúncios publicitários (especialmente vindos do setor público) para manter a circulação em dia.

Não é preciso ser economista para entender que a segunda forma é mais fácil, mais lucrativa e corre-se menos risco. E como vivemos em uma época em que o que vale é a “lei do menor esforço”, a grande, quer dizer, a esmagadora maioria dos veículos de comunicação optou por lucrar desta forma. Quem ganha com isso? Os seus proprietários, que dormem tranqüilos (?!) em suas casas de luxo em condomínios e passeiam com seus carros importados sabendo que haverá sim recursos para manter o jornal em funcionamento. Quem perde? E precisa mesmo responder?

Vivemos então na era em que a frase de Nelson Rodrigues perde o sentido, pois agora toda unanimidade é correta! Viva a unanimidade! A “praga” invade todo o cenário nacional e as fontes deixam de serem fontes e passam a agir como editores dos jornais. Alguém acompanhou as estreitas relações entre o bicheiro Carlinhos Cachoeira e o chefe da sucursal da “consagrada” Veja em Brasília, Policarpo Júnior? Pois é, se as coisas lá em cima acontecem assim, imagina nos menores veículos, em que a dependência financeira é ainda maior...

É cada vez mais comum então que a unanimidade dos discursos seja o imperativo na imprensa, especialmente nos menores veículos. Movidos pelo interesse (ou melhor, pela extrema dependência) financeiro(a) daqueles que ocupam o poder, os jornais (impressos, emissoras de rádio e TV) passam a levantar bandeiras conjuntas e, estranhamente, tudo passa a ser mais “normal” do que antes. O que outrora era passível de críticas, passa a ser encarado com naturalidade, como “desafios” e “percalços” de quem manda (de fato!)  E o interesse público? Quem mesmo?


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