Ricardo Nogueira
Jornalista, Especialista em Docência do Ensino Superior, MBA em Gestão da Comunicação Integrada, Mestre em Educação, Cultura e Organizações Sociais, Mestrando em Educação Tecnológica. Professor da Faculdade Pitágoras nos cursos de Jornalismo, Publicidade e Propaganda e Gestão Comercial.
Na última semana, especificamente na última quinta-feira, um importante aniversário de 20 anos foi pouco lembrado pela imprensa nacional. Em 16 de agosto de 1992 um grande número de estudantes brasileiros foi às ruas, vestindo roupas pretas e com as caras pintadas da mesma cor, em protesto aos demandos do Governo Federal, ocupado então por Fernando Collor. A ironia é que o presidente havia convocado, na véspera, uma manifestação popular conclamando os jovens a vestirem verde e amarelo e ocuparem as ruas para mostrar seu apoio à Presidência. Tal manifestação serve como marca por vários motivos: demonstração de força popular, mobilização (verdadeira) da juventude em torno de uma causa nobre e a imprensa atuando como elemento decisivo para levar as informações de interesse público à população.
Por ter sido um momento
ímpar e extremamente relevante para a história nacional, fico surpreso pelo
fato não ter sido lembrado da forma como merece pela grande imprensa. Um dos
motivos pode, como já discutido anteriormente neste espaço, dizer respeito à
superficialidade e falta de investigação em temas relevantes atualmente na
mídia nacional. Sobre isso, vale a pena citar o brilhante jornalista Mário
Sérgio Conti, atualmente apresentador do Roda Viva e repórter da revista Piauí,
que lançou em 1999 o livro “Notícias do Planalto”, em que conta a relação de
Collor com a grande imprensa.
A obra, indispensável para
quem gosta de estudar a relação entre jornalismo e política, analisa desde o
surgimento do fenômeno midiático Collor como “caçador de marajás” até sua
queda, provocada em parte pela atuação da imprensa. O principal fio condutor do
texto é a íntima relação do protagonista com a mídia, responsável em grande
parte por sua eleição e também por seu processo de impeachment, ao denunciar em
belas reportagens investigativas os esquemas de corrupção comandados pelo fiel
escudeiro PC Farias. Resenhas à parte, “Notícias do Planalto” revela os
bastidores de investigações conduzidas por repórteres com compromisso com o
interesse público.
Hoje, 20 anos depois de tudo
isso, o mesmo Mário Sérgio Conti publicou no último mês, na Piauí, uma
reportagem sob o título “Escândalos da república 1.2”, em que analisa a
situação da imprensa hoje e seus principais personagens à época das denúncias.
De forma surpreendente, o jornalista expõe que a maioria esmagadora dos então
repórteres investigativos atualmente está “do outro lado do balcão”, tendo
atuado ou atuando como assessores de comunicação e imprensa de personalidades e
políticos de reputação duvidosa como João Paulo Cunha, Agnelo Queiroz, Joaquim
Roriz, Roseana Sarney, Ricardo Teixeira (CBF), Daniel Dantas (banco
Opportunity), Fernando Cavendish (empreiteira Delta) e mesmo Carlos Augusto de
Almeida Ramos, o Carlinhos Cachoeira.
Sabe-se que, atualmente, as
áreas de consultoria e assessoria de comunicação, especialmente relacionadas à
área política, costumam ser as mais bem remuneradas para estes profissionais de
palavras e ideias. Apesar disso, como pode um time inteiro de grandes
profissionais deixar de lado sua vocação, expertise e, especialmente,
compromisso público para servir à blindagem de figuras tão particulares? Será
mesmo que vale a pena abrir mão dos princípios e de uma reputação construída à
base da competência para ganhar uns trocadinhos a mais (mesmo que sejam
trocadões a mais) no final do mês? E a consciência, quanto custa?
Um dito popular enuncia que
todo homem tem seu preço. Há quem duvide e quem concorde com a afirmação. E há
ainda quem se vende por um preço muito baixo, irrisório até. Acho que seria
interessante implantar, nos vestibulares de jornalismo, um teste para medir o
caráter e a corruptibilidade de cada candidato a repórter. Manter-se fiel aos
princípios em uma profissão passível de ofertas “tentadoras” a todo o momento
não é tarefa fácil. Mas também não é impossível e milhares de exemplos podem
ser dados. Nada contra a ambição coerente, mas tudo contra a ganância
desenfreada. Há formas e formas de se dar bem e ser reconhecido (inclusive financeiramente)
no meio profissional do jornalismo. Cabe a cada um a decisão entre subir a pé
ou num jato superfaturado.
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