terça-feira, 18 de maio de 2010

Responsabilidade Social: uma faca de dois gumes

Uma das ondas do momento no concorrido mercado de negócios tem nome: Responsabilidade Social (RS). Isso se deve a conceitos das áreas de Administração e Marketing que apontaram a necessidade das empresas aliarem a seus objetivos uma forma de “camuflarem” estragos políticos, financeiros e, principalmente, sociais e ambientais. Com o crescimento do terceiro setor, começaram a surgir em todo o mundo ações que ligam determinadas empresas a organizações que visam melhorar a face social e/ou ambiental das comunidades.

Na verdade, pode-se perceber que tais instituições nada mais são do que entidades que fazem o que o governo e suas instâncias deveriam fazer e não o fazem. É fato que a grande maioria das ONGs desenvolve trabalhos reconhecidamente sérios e de grande valor para a sociedade, mais especificamente para as comunidades onde atuam. Mas que, no fundo, tais ações poderiam ser feitas por órgãos públicos (até mesmo por fazerem parte de suas alçadas), também não deixa de ser verdade.

A grande sacada dos estrategistas empresariais foi perceber que, para desenvolver as atividades a que se dispunham, as ONGs precisavam de recursos. E aí surgiu o conceito de RS, como uma forma das empresas “amenizarem” os malefícios causados pela disputa no mercado. Estava tudo pronto: de um lado pessoas precisando de ajuda e outras querendo ajudar, mas sem recursos; de outro as empresas, que buscavam ter maior reconhecimento público e possuíam os recursos necessários para arcar com as despesas das ações sociais necessárias. Assim foram feitas e consolidadas parcerias entre as instituições do terceiro setor e os grandes grupos econômicos.

Sabe-se que, hoje, comunicação e marketing são áreas estratégicas dentro das empresas e que o seu trabalho ajuda a tornar uma marca bem aceita ou não pela sociedade. Com isso, as grandes corporações mundiais, ao desenvolverem suas ações de RS, ganham em dobro: com o respeito e admiração pela comunidade atendida nos programas sociais e, talvez a principal vitória (ao menos do ponto de vista do marketing agressivo), a conquista do respeito junto à sociedade através de ações que carregam em si algo de valor imensurável: credibilidade.

Apesar de soar como eventual solucionador de problemas, a RS tem pontos negativos. Um deles consiste no próprio nome: a responsabilidade. Da mesma forma que uma empresa é responsabilizada numa eventual falha nos seus produtos, o insucesso em alfabetizar uma criança ou um idoso que for maltratado em seu projeto social também será responsabilidade da empresa. E organizações que possuem tradição e uma história de sucesso conquistada ao longo de anos podem ver seu nome afundando em determinado erro de estratégia.

Outro fato que incomoda e talvez impeça melhores resultados das ações de RS das empresas é a competição, a concorrência. Até mesmo na área social há disputas ferrenhas entre empresas habitualmente concorrentes no mercado. Isso gera um esforço muito grande por parte destas organizações em divulgar as ações feitas. Se tamanha verba fosse revertida em mais e melhores ações, com certeza os resultados seriam maiores, melhores e mais duradouros.

Por isso a RS deve ser vista como uma faca de dois gumes. É inegável a ajuda obtida pela sociedade através destes programas, mas, por outro lado, o desenvolvimento destas ações traz uma espécie de dependência dos empresários, o que não é bom para a democracia.

O que pode ser um clarão em meio a tudo isso é que a sociedade não é tão inocente quanto se costuma pensar. Por mais que projetos sociais tragam credibilidade para as empresas, seus clientes sabem que estas ações estão embutidas no preço dos produtos. A sociedade sabe que não existe Papai Noel e que ninguém (pelo menos no mundo empresarial) dá nada de graça. Usar a tática de que projetos sociais são custeados pelos lucros das empresas, e não entram como despesas, não convence. O lucro pertence aos acionistas, não aos executivos de uma organização.

A sociedade deve continuar de olhos abertos, pois o patrocínio de uma escola que alfabetiza adultos não exime uma empresa da responsabilidade de lançar quantidades astronômicas de gases tóxicos na atmosfera. Vale a iniciativa de ajudar a quem precisa sim, mas daí a posar de super-herói não dá.

* Ricardo Nogueira
Jornalista, Mestre em Educação, Cultura e Organizações Sociais.
Professor dos cursos de Jornalismo e Publicidade e Propaganda da Faculdade Pitágoras/Divinópolis

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