terça-feira, 25 de maio de 2010

Aprendendo a ler televisão

Recentemente, fui convidado pela Secretaria de Educação para mediar um debate sobre hábitos de leitura, no lançamento do projeto Minha cidade lê. Ali, enquanto discutíamos sobre a formação de leitores, questionei se não deveríamos dar às imagens e sons da televisão a mesma atenção que damos ao livro. É sobre isso que gostaria de tratar aqui, instigado por um grupo de estudantes da Faculdade Pitágoras que abordou a relação da criança com a televisão em seu trabalho de conclusão de curso no ano passado.

Se já há uma aproximação da criança com a tevê, essa relação do público infantil com os meios de comunicação é, na maioria das vezes, condenada antes que se observem outras possibilidades de abordagem. Ainda há um ranço iconofóbico na nossa cultura, e isso acaba nos conduzindo a uma formação avessa às linguagens audiovisuais.

É preciso ampliar a discussão sobre televisão. Exemplo disso é Laboratório de Pesquisa sobre Infância, Imaginário e Comunicação (Lapic), da USP, que tem desenvolvido interessantes estudos a respeito da recepção infantil dos conteúdos da televisão. Falta, porém, uma repercussão maior dessas discussões, em contraposição ao discurso apocalíptico dos males provocados pela televisão à sociedade contemporânea.

Podemos caminhar noutro sentido, observando como a televisão pode ser utilizada como eficaz ferramenta pedagógica e de transmissão cultural. Uma questão aqui merece destaque: se uma criança começa a aprender a ler depois que vai para a escola, antes disso, a mesma criança já acumula uma vasta experiência como leitora das imagens e sons da televisão. Já incorpora linguagens, estruturas narrativas e amplo repertório que lhe são apresentados pela tevê. Da mesma forma, por meio dos desenhos animados, conforme argumenta o pesquisador Alexandre Paza, as crianças têm a oportunidade de conhecer como o mundo é percebido pelo outro, compartilhando significações, linguagens e valores.

Nesse cenário é que se evidencia a importância dos mediadores dessa recepção infantil: seja em casa ou na escola. Os conteúdos, de acordo com a professora Márcia Marguze, do Lapic, devem ser discutidos entre crianças e adultos (pais e educadores), para que se preencham possíveis lacunas interpretativas.

Muito se diz que as crianças de hoje deixam tudo de lado pra ficar “vendo televisão”. Decidi então reparar alguns primos meus diante da televisão, todos entre cinco e oito anos. Estavam em frente à tevê, mas brincando. Nenhum desenho conseguiu distraí-los da conversa e do jogo inventado na hora. A televisão não hipnotiza ninguém, nem supera o prazer da brincadeira das crianças; pelo menos daquelas que têm com quem e onde brincar. O que falta muitas vezes é opção: “na rua é muito perigoso”, “o amigo mora longe”, “papai tá muito cansado”...


* Bernardo Rodrigues
Jornalista, especialista em Filosofia e Mestre em Teoria da Literatura.
Professor dos cursos de Jornalismo e Publicidade e Propaganda
da Faculdade Pitágoras/Divinópolis.

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