quinta-feira, 24 de março de 2011

CQC: bom jornalismo acessível a todos

Francisco Resende Costa Neto
Coordenador dos cursos de Jornalismo e Publicidade e Propaganda
Faculdade Pitágoras/Divinópolis-MG


No ano passado escrevi, neste espaço, sobre minha admiração e respeito pelo trabalho jornalístico proporcionado pelo programa CQC (Custe o que Custar), da Rede Bandeirantes. Apesar das brincadeiras e do tom extremamente irônico e sátiro dos integrantes, a cada novo programa tenho a convicção de que é um estilo que tende a crescer, mesmo quando a abordagem envolve assuntos de grande relevância. Ainda mais quando se trata de um trabalho sério - lapidado com um belo tempero de humor político - feito pelos repórteres extremamente preparados e bem informados. Mostrando a realidade e situações de extrema importância para a família brasileira, mas sem os clichês das abordagens tradicionais que marcam os telejornais. E sabendo o limite que envolve o bom jornalismo investigativo de programas humorísticos que pouco prezam pelo conteúdo, como o Pânico na TV e o Casseta & Planeta. Em resumo: sensacional.

Mas nem sempre este trabalho é reconhecido como jornalismo e gera cenas patéticas, como algumas ocorridas em 2010. A situação mais deselegante envolveu o deputado federal Nelson Trad (PMDB-MS), que agrediu, de forma violenta, uma equipe do programa dentro do Congresso Nacional. Como já escrevi neste espaço, situações como esta deixam claro o descontrole e a sensação de grande poder nas mãos de um simples deputado, que depois de 4 anos perde a tão debatida e injusta imunidade parlamentar. Aliás, assunto polêmico que renderia colunas e colunas neste jornal.

É bem verdade que discute-se, no meio acadêmico, a articulação entre informação e entretenimento promovida pelo programa, em virtude de se misturar formas expressivas de audiovisual (edições e animações) que atravessam a cultura televisiva, especificamente os usos que o programa faz da montagem expressiva. Conforme estudo publicado pela Profa. Juliana Gutmann, doutoranda em Comunicação pela Universidade Federal da Bahia, as manipulações gráficas, os sincretismos visuais e sonoros, os enquadramentos que enfatizam o processo de produção, fazendo da enunciação o próprio enunciado, são alguns dos dispositivos usados para a promoção de um curioso efeito de sentido, em que o riso e a diversão funcionam como elementos de afirmação de uma “suposta” atuação jornalística. Mas, num país carente de cultura e com pouca formação que gere informação, talvez não seja esta a fórmula que mais se aproxime da realidade do brasileiro?

A analogia do figurino dos repórteres aos eternos mitos do cinema, MIB (Homens de Preto), com seus impecáveis ternos pretos e óculos escuros, além de uma fortíssima semelhança de trilha sonora com Missão Impossível (resultado da série de espionagem sobre as aventuras de um grupo de agentes secretos do governo americano) não tiram do CQC seu caráter jornalístico e informativo. Apenas incrementam e buscam, com base nas experiências e abordagens diferenciadas, abordar assuntos de grande relevância, como aumento de impostos, corrupção e lavagem de dinheiro, sob um formato mais leve, acessível e, acima de tudo, compreensível ao cidadão comum. Talvez seja isso que venha incomodando tanta gente.

Percebe-se que o formato tradicional do telejornalismo vem mudando nos últimos anos. E tende a se adaptar ainda mais à realidade de novas tecnologias como a TV Digital e a WebTV. Algumas rotinas começam a ser desmistificadas e o jornalismo investigativo vem realmente conquistando um espaço antes dedicado apenas à informação. De repente, a figura da mosca voando o tempo todo nas reportagens do CQC (que busca realçar o sentido de vigilância e de um possível retorno da equipe àquele local) indique esta nova tendência. Através de programas como o CQC fica fácil perceber a diferença entre jornalismo investigativo e jornalismo sensacionalista. E é com esta expectativa que vislumbro uma sensível melhora, mesmo que a médio e longo prazos, da programação vespertina na TV aberta brasileira.

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