quarta-feira, 14 de novembro de 2012

Protestos virtuais

 
Ricardo Nogueira
Jornalista, Especialista em Docência do Ensino Superior, MBA em Gestão da Comunicação Integrada, Mestre em Educação, Cultura e Organizações Sociais, Mestrando em Educação Tecnológica. Professor da Faculdade Pitágoras nos cursos de Jornalismo, Publicidade e Propaganda e Gestão Comercial.
 


 
“Seria mais fácil fazer como todo mundo faz. O milésimo gol sentado na mesa do bar”. A frase, extraída da música “Outras Frequências”, do artista gaúcho Humberto Gessinger, mostra bem a situação em que vivemos atualmente. A promessa da internet e suas quebras de fronteiras culturais e sociais, ao contrário do previsto, não gerou jovens mais politizados e atuantes. Ao invés disso, temos cada vez mais protestos de mentirinha, revoluções no sofá e pessoas extremamente corajosas protegidas pelo falso anonimato da rede mundial de computadores. É uma atualização das pessoas que, na minha infância, eram acusadas de “jogar bolinha de gude no tapete” ou de “soltar pipa no ventilador”.

A geração M (mundi, millenium, multimídia) é hoje campeã dos protestos virtuais. Recentemente, uma mobilização entre os “facebookeiros” tomou conta de todo o país. As pessoas, com indignação frente a uma possível retirada de determinada tribo indígena de seu habitat em virtude da necessidade progressista, resolveram protestar. E fizeram isso da seguinte forma: inseriram entre seu primeiro nome e o sobrenome alguns nomes indígenas, tais como Guarani-Pataxó. Então, um João da Silva qualquer passou a se chamar, no Facebook, João Guarani Pataxó da Silva. Seria engraçado, se não fosse triste.

E essa tristeza vem da passividade da juventude em suas formas de reivindicação. O impressionante é que, para contestar pais, parentes, amigos ou (especialmente) professores, há uma agressividade e uma intensidade física fora do comum. Mas se é para apoiar a tribo indígena, lutar pelos direitos dos pandas chineses ou protestar contra um governo corrupto, a internet parece ser o lugar ideal e mais seguro. Ponto para a tecnologia.

Num passado bem recente, a juventude, responsável pelas principais mudanças revolucionárias da História, ainda possuía uma atividade intensa em seus movimentos sociais. No Brasil mesmo, as décadas de 1980 e 1990 foram palco de duas grandes manifestações populares, lideradas pela juventude, que geraram resultados positivos para a questão democrática. Mesmo quem não teve a oportunidade de participar, com certeza conhece a campanha pelas “Diretas Já” e os “caras-pintadas” que ajudaram a derrubar o então presidente Fernando Collor.

Hoje, além das diversas mobilizações virtuais, os jovens também vão para as ruas em ocasiões especiais. No entanto, os motivos são outros. No começo desse mês tivemos um claro exemplo disso. Em “comemoração” (?!) ao Dia de Finados, centenas de jovens (inclusive em Divinópolis) tomaram as ruas e pintaram suas caras. Não, não era um protesto contra a desigualdade social, contra a corrupção ou em defesa de uma causa ambiental. O motivo é chamado de “Zombie Walk Day”, ou seja, uma imitação de uma tradição estadunidense em que as pessoas, em referência aos “mortos-vivos”, se vestem e se maquiam com temas de terror. E tem havido, ainda, uma outra grande mobilização na cidade nos últimos anos. Trata-se da Guerra de Travesseiros (Pillow Fight Day), que reúne a “nata” da juventude virtual em alguns dos poucos momentos de contato físico. Esta é a diferença entre as mobilizações de ontem e de hoje.

Não é preciso ser psicólogo ou analista social diplomado para perceber o quanto essas mudanças estão reinventando a forma de relacionamento entre as pessoas. O tema é extremamente amplo e as discussões são muitas para caber neste espaço. Até mesmo porque não só de coisas ruins é feito o ambiente virtual. O polêmico blog “Diário de Classe”, feito pela adolescente catarinense Isadora Faber, é um exemplo disso. Ela utilizou a internet como forma de denúncia para os problemas encontrados na estrutura escolar. Mas, nesse caso, a rede é usada apenas como ponto de partida, e não de chegada.

Já que atitudes como essa são infinitamente mais raras do que os protestos virtuais, fica a esperança de que a juventude entenda que há vida além da net. E, principalmente, que aproveite as oportunidades que a rede mundial de computadores gera para iniciar as mobilizações, mas não para terminarem ali. É fato que fazer o milésimo gol sentado na mesa de um bar, no conforto de um sofá ou em frente ao computador é mais fácil. É por isso que, apesar das críticas, Túlio Maravilha é um sujeito a se admirar. Afinal, tentar fazer o milésimo gol em um campo de verdade exige mais talento e vontade do que fazê-lo no Playstation.  

 

 

 
 

 

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