segunda-feira, 19 de novembro de 2012

Protestos virtuais e o fetiche da crítica



Bernardo Rodrigues Espíndola
Jornalista, Especialista em Filosofia, Mestre em Teoria da Literatura. Membro do grupo de pesquisa Intermídia, vinculado ao CNPq, com pesquisa sobre Semiótica e as relações entre literatura e outras artes.  Professor da Faculdade Pitágoras nos cursos de Jornalismo, Publicidade e Propaganda e Engenharias.



“Protestos virtuais”. Este foi o título de um artigo publicado pelo colega professor e jornalista Ricardo Nogueira sobre a atuação crítica da juventude nas redes sociais digitais. E foi quando li o texto do Ricardo que decidi escrever um pouco sobre essas novas formas comunicação que surgem com a internet e seus hipertextos, neste mundo de simulacros, hiperrealidade e hiperatividade.

Às vezes, parece que a linguagem passa mesmo por um esvaziamento do sentido, uma desconexão cada vez maior entre o discurso e o mundo atual. Enquanto isso, as pessoas tornam-se cada vez mais dispersas, desengajadas, desatentas. Nesse sentido, até que ponto podemos falar de uma consciência crítica que se fortalece com a internet? Se é que podemos falar em fortalecimento de alguma crítica... O que percebo em ambientes como o Twitter, Facebook etc. é mais um processo de “fetichização” da crítica do que mesmo uma crítica.

Vemos cada vez mais a proliferação de um discurso que gira em torno de si mesmo e se sobrepõe à realidade ou a uma efetiva ação, além da ação de dizer e expor uma indignação. O importante parece que é mesmo ir para a internet, “rodar a baiana” e esperar que mais gente entre na roda. Se bombar, já valeu o protesto.

Pior ainda é o protesto e a mobilização virtual em defesa do imbróglio. É o caso da campanha do voto nulo, que, como tantas outras semelhantes, circulou pelo Facebook. A campanha incentivava o voto nulo com o argumento de que, se mais da metade dos eleitores anulasse o voto, haveria novas eleições. Falácia pura. Isso não está previsto na lei; e, se estivesse, que vantagem traria? Por outro lado, a internet tem permitido uma onda de denúncias irresponsáveis, quase sempre mentirosas, que se escondem por trás do anonimato virtual para promover difamação e injúria. Seria essa a contribuição da internet para a Democracia? Isso é um atentado à Democracia, cada vez mais praticado no Brasil inteiro e que não se limita aos sites de relacionamento.

O fato é que a reclamação vigora; os protestos virtuais pululam. E a crítica responsável, coerente, sensata torna-se cada vez mais rara. Fica o discurso sem fundamento, girando em torno de si mesmo – fica o fetiche da crítica. Isso me lembra o pensamento de Jean Baudrillard sobre a espetacularização da realidade. Já que a distorção do pensamento do filósofo francês já inspirou até filme (Matrix), pode render alguma reflexão aqui também. Se Baudrillard mostra que, na cultura contemporânea, os sistemas de signos operam no lugar dos objetos, o que vemos nos “protestos virtuais” não é algo muito diferente: é o discurso da mobilização no lugar da mobilização – a crítica convertida em espetáculo.

Nesse cenário, não importa se a crítica tem fundamento ou não, se a denúncia é verdadeira ou não, se as propostas são viáveis ou não. O que importa é criticar, denunciar, protestar e tornar-se um espetáculo. O que importa é a próxima atualização do perfil e suas respectivas curtidas, compartilhamentos, comentários etc. Atualmente, busca-se mais a proliferação de um discurso de protesto do que o seu resultado. Esse efeito viral quase sempre não garante resultado nenhum além de mais uma moda fugaz que se dissolve em poucos dias.

Não se pode generalizar, claro. Afinal, casos de sucesso de flashmobs e outras ações que saem da internet para as ruas existem aos montes por aí. É o caso dos desfiles de fantasiados, guerras de travesseiros e outras festas que mostram que as redes sociais não são apenas digitais, elas extrapolam a internet, especialmente quando não tem função nenhuma além da simples diversão e entretenimento. Como tantos protestos online, elas esgotam-se em si mesmas e revelam mais uma vez que o que importa é mesmo “curtir”.

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