terça-feira, 16 de outubro de 2012

Diga-me o que lês


Ricardo Nogueira

Jornalista, Especialista em Docência do Ensino Superior, MBA em Gestão da Comunicação Integrada, Mestre em Educação, Cultura e Organizações Sociais, Mestrando em Educação Tecnológica. Professor da Faculdade Pitágoras nos cursos de Jornalismo, Publicidade e Propaganda e Gestão Comercial.


Já discutimos outra vez, nesse mesmo espaço, que um mau hábito dos brasileiros diz respeito ao baixo índice de leitura. Na ocasião, tal fato foi enunciado como um dos responsáveis pelo sucesso dos jornais populares, que estão mais fortes a cada dia. Hoje, no entanto, vamos continuar tocando nessa “ferida”, mas de outra forma: quando leem, o que os brasileiros andam lendo?

Para quem não sabe, um dado importante é que no ranking das 10 revistas mais lidas do país, sete, nada menos do que sete tratam de fofocas, ou melhor, da vida interessantíssima das celebridades e pseudofamosos. Com exceção das semanais Veja, Época e Isto É, as demais 7 posições da lista das 10 mais lidas do país são ocupadas pelos seguintes títulos: Caras, Viva Mais, Ana Maria, Contigo, Tititi, Minha Novela e Malu. Percebe-se, pelos títulos, que são revistas importantíssimas e que conseguem levar a seus leitores informações de verdadeiro interesse público.

É por dados como esse que às vezes me questiono se estou no país ou na profissão errada (ou será nos dois?). Como pode um país que tem um bom jornalismo, bons repórteres, bons escritores e bons títulos ser tão superficial assim? Não possuo os dados, mas acredito que na mesma linha da preferência editorial estão os programas televisivos destinados ao entretenimento puro, à fofoca ou a conteúdos sem a devida importância.

Nos livros o resultado é parecido. Basta analisar as listas dos mais vendidos divulgadas semanalmente nas principais revistas do país e verá a forma como se compõe o gosto nacional. Autoajuda, ficções “da moda” e biografias de famosos predominam ano após ano. Isso num país que possui grandes poetas e escritores. Talvez isso ocorra por problemas de educação (e falta de). Vou explicar melhor.

Um dos problemas da educação é que as crianças, na fase escolar, são “obrigadas” a lerem obras sobre temas que não gostam ou com linguagem inapropriada para sua idade. Apesar de não ser psicólogo nem pedagogo, minha pequena experiência com a docência me prova isso da forma mais prática possível: o que não envolve não se aprende. E o que não se aprende costuma causar arrepios e desgostos eternos em que é “obrigado” a fazer.

Por isso, forçar os alunos a lerem obras de escritores como Machado de Assis, Graciliano Ramos, José de Alencar, entre outros, em um período em que eles estão mais preocupados com outras coisas contemporâneas, costuma causar traumas para o resto da vida. Nada contra oferecer essas leituras aos alunos. Pelo contrário, sou um grande defensor da leitura e sei a importância que ela tem para a formação de qualquer pessoa. Mas “obrigar” uma criança ou adolescente a ler uma obra que ela não se interessa e nem mesmo entende o sentido é dar murro em ponta de faca.

Já o outro problema, cultural e histórico, e por isso mais difícil de resolver, diz respeito à falta de educação. Não vou nem comentar sobre a digitalização do mundo e o fato de o hábito da leitura estar sendo deixado de lado em virtude da dependência infanto-juvenil pela internet, pois esse assunto por si só já daria um livro. E como ninguém tem mais paciência de ler... Quando falo de falta de educação quero dizer sobre a falta de hábito e incentivo que as crianças têm, ainda dentro de casa, para a leitura. Hoje em dia é muito mais prático deixar os filhos serem “educados” pela TV do que “gastar um tempo” lendo para eles ou conversando sobre literatura. É também mais cômodo dar um tablet para que ele desenvolva sua capacidade de buscar boas leituras (?!) do que levá-lo a uma biblioteca. E, assim, quando estes jovens, sem culpa, vão buscar algum tipo de leitura, querem sempre o mais fácil, o mais rápido, o que dá para ler sem ter que pensar muito. Isso explica um pouco o ranking das revistas e livros mais vendidos do país.

Costumo dizer para meus alunos que a melhor forma de escrever bem é ler, ler, ler, ler, escrever, escrever, escrever e escrever. Para quem pensa que tal preocupação sobre a falta de leitura é algo pessimista, apocalíptico ou que seus efeitos ainda são muito distantes, deixo uma reflexão no ar. Repare a diferença nas letras das músicas atuais e nas canções feitas antes de 1990. Será que não teremos mais Chicos Buarques, Miltons, Caetanos, Gils? Será que temos que nos contentar com Restart, Fernando e Sorocaba e outros dos novos gêneros? Será que aqueles “caras” da hoje chamada MPB eram tão inteligentes assim do nada? Será que é dom? Meus pais, que graças a Deus sempre me incentivaram a ler, me diziam sempre: “Diga-me com quem andas e direi quem tu és”. Atrevido como sou, sugiro a mudar o dito para: “Diga-me o que lês e direi qual o teu futuro”.

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